As inovações da Lei 13.105/2015 nas ações de família
A Lei 13.105/2015, mais conhecida como Novo Código de Processo Civil (NCPC) trás o procedimento denominado AÇÕES DE FAMÍLIA no rol dos PROCEDIMENTOS ESPECIAIS DE JURISDIÇÃO CONTENCIOSA, prevendo nos artigos 693 a 699 as questões processuais litigiosas quanto ao divórcio, separação, reconhecimento e extinção de união estável, guarda, visitação e filiação.
Além desta novidade organizacional, o NCPC prevê que o procedimento deverá ser utilizado nas demandas que buscam reconhecer e extinguir união estável, já que no CPC-73 não havia tal previsão pelo fato do instituto ter sido previsto na Constituição Federal de 1988.
Percebe-se claramente que o legislador buscou fazer com que a resolução dos conflitos apresentados perante o Poder Judiciário fosse realizado pelas próprias partes, possibilitando alcançarem uma solução amigável para o que se discute. Tanto é que o artigo 694 indica que nas Ações de Família serão empreendidos todos os esforços para a solução consensual das controvérsias. Para isso, o Juiz poderá se valer do auxílio de profissionais de outras área de conhecimento para a mediação e conciliação.
E por falar em mediação e conciliação, houve a inclusão desta como uma verdadeira fase processual. Isso por que a intenção ou não de se submeter a sessão de conciliação e mediação passa a ser requisito da petição inicial, conforme artigo 319, inciso VI, devendo a petição indicar “a opção do autor pela realização ou não de audiência de conciliação ou de mediação”. Assim, se o autor manifestar positivamente à realização desta audiência, o réu deverá comparecer obrigatoriamente, sob pena de ser multado em até dois por cento da vantagem econômica pretendida ou do valor da causa, sendo esta revertida em favor da União ou do Estado. O não comparecimento das partes à audiência de conciliação ou mediação se traduz em verdadeiro ato atentatório à dignidade da Justiça.
Apesar da nobre intenção do legislador, o regramento exposto acima vem gerando questionamentos, uma vez que o artigo 334, parágrafo 4º, inciso I prevê que tal audiência só não se realizará se as partes manifestarem expressamente pelo desinteresse na composição amigável. Tudo indica que se uma das partes manifesta positivamente pela designação da audiência de conciliação ou mediação, a outra ficará obrigada a comparecer, o que fere um dos princípios da mediação que é justamente a autonomia da vontade, positivada no artigo 166 do NCPC. Sendo assim, a melhor interpretação do tema é que, diante da expressa manifestação de uma das partes sobre a desnecessidade desta audiência, a mesma não deverá ocorrer.
Além disso, tal audiência não será realizada se o objeto da demanda não admitir autocomposição, é o que prevê o artigo 334, parágrafo 4º inciso II do NCPC.
Na verdade essa audiência é tão importante que o NCPC prevê a participação de profissionais de outras áreas e a possibilidade de suspensão do processo, à requerimento das partes, enquanto se submetem a mediação ou atendimento multidisciplinar, demonstrando que todos os esforços devem ser adotados para dar uma solução a lide de forma consensual.
Outra inovação é fato de que o demandado será citado para o comparecimento à audiência de conciliação e mediação sem ter acesso a cópia da petição inicial. Trata-se de uma novidade de grande relevância, pois faz com que o demandado não tome ciência dos fatos articulados na inicial, que muitas vezes são realizados de forma desrespeitosa, inverídica e até mesmo ofensiva, o que pode tornar a audiência conciliatória sem efeito, eis que o demandado comparecerá disposto a empregar todos os meios para desfazer o mal entendido colocado na inicial, deixando de lado o verdadeiro objetivo da norma que é conciliar.
Muito embora a citação seja realizada sem a cópia da inicial, é assegurado ao réu o direito de examinar seu conteúdo a qualquer tempo. Tal previsão evita o conflito de normas com o artigo 7º, inciso XV da Lei 8.906/94 – Estatuto da OAB - que permite ao advogado ter vista dos processos judiciais. Porém esse acesso pode arruinar a intenção do legislador em ocultar os eventuais maldizeres contidos na inicial, impedindo ou ao menos dificultando a ocorrência da conciliação.
Caso não haja acordo nesta audiência, inicia-se o prazo para o demandado apresentar sua defesa, seguindo o rito do procedimento comum (art. 697 que possui remissão ao art. 335)
Houve alteração também quanto a competência para a propositura das Ações de Família, que deverão ser propostas, em princípio, no domicílio do guardião de filho incapaz (art. 53, I, “a”). Tal medida veio em boa hora, haja vista que diversas discussões eram travadas quanto ao tema, uma vez que a Constituição Federal trouxe isonomia entre o homem e a mulher, não se justificando a regra do foro privilegiado previsto no artigo 100, inciso I do CPC/73. Na ausência de filho incapaz, a demanda deverá ser proposta no último domicílio do casal (art. 53, I, “b”) ou, subsidiariamente, no domicílio do réu, se nenhuma das partes residirem no antigo domicílio do casal.
Outro dispositivo inédito é o artigo 699 que prevê a participação de especialista juntamente com o magistrado ao tomar depoimento do incapaz nos casos em que envolver discussão sobre fato relacionado a abuso ou alienação parental, sendo tais situações já regulamentadas no artigo 2º da Lei 12.318/2010.
É imperioso salientar que as demandas consensuais, quanto a estas questões, permanecem previstas no artigo 731 do NCPC.
Além das inovações expostas acima, o NCPC consagrou diversos entendimentos jurisprudenciais quanto ao cumprimento de sentença que reconheça a exigibilidade de obrigação de prestar alimentos, estando prevista nos artigos 528 a 533. Um exemplo é previsão de que o débito alimentar capaz de levar o devedor a prisão compreende até as três prestações anteriores ao ajuizamento da execução e as que se vencerem no curso do próprio, não sendo essa uma novidade haja vista o entendimento sumulado no enunciado 309 do STJ.
Outro entendimento, sendo este doutrinário, que foi positivado foi o regime de cumprimento de prisão civil que deverá ser integralmente em regime fechado, devido a sua natureza civil que não pode ser assemelhado com a prisão penal, caindo por terra qualquer discussão sobre a possibilidade de cumprimento em regime semiaberto nos casos de devedor que estiver exercendo atividade laboral com vinculo empregatício, já que alguns defensores alegavam que o regime semiaberto permitiria ao executado exercer sua atividade laboral durante o dia, possibilitando-o quitar seu débito alimentar, enquanto se recolhe à unidade prisional à noite.
Já as inovações no cumprimento de sentença que fixa os alimentos cabe destaque para a possibilidade de o Juiz mandar protestar o pronunciamento judicial, principalmente se a justificativa apresentada não for aceita pelo magistrado, uma vez que tal justificativa impede apenas a decretação da prisão civil, não havendo qualquer obstáculo para que a mesma seja protestada, já que a dívida existe. Tal autorização também ocorre se depois de transcorrido o prazo de três dias sem que o executado tenha apresentado justificativa, não efetue o pagamento ou não prove que efetuou. Porém, nesse caso, o magistrado está autorizado a mandar protestar e ao mesmo tempo decretar da prisão civil, traduzindo-se em mais uma forma de compelir o executado a pagar sua dívida. Tal inovação é muito salutar, pois muitos são os casos em que o executado, mesmo após ter sua prisão civil decretada, continua levando uma vida normal caso o exequente desconheça seu paradeiro, o que inviabiliza por completo o cumprimento da ordem prisional pelo Oficial de Justiça. Com o protesto, certamente o executado terá dificuldades em obter crediário bem como outros impedimentos oriundos de um protesto extrajudicial, levando-o a buscar meios para liquidar o débito alimentar para se livrar de tal embaraço.
Cabe destaque para a previsão, um tanto controvertida, quanto a prisão civil do executado ser fixada de um a três meses, pois a lei dos alimentos estabelece o prazo de no máximo sessenta dias (art. 19 da Lei 5.478/68), sem qualquer revogação desta nas disposições finais e transitórias do CPC. Há quem defenda que o último período deva prevalecer sob o argumento de que a execução deve ser realizada da forma menos gravosa para o executado. Entretanto, diante a natureza dos valores pleiteados bem como o critério da cronologia que impõe que a norma mais recente prevalece no confronto com a norma anterior, alguns entendem que esse novo prazo é o que deve prosperar.
Outra inovação para a quitação dos alimentos é a possibilidade de o débito objeto da execução poder ser descontado, de forma parcelada, diretamente nos rendimentos ou rendas do executado sem prejuízo do pagamento dos alimentos vincendos, ou seja, aqueles que o executado já estava obrigado a pagar mês a mês, independente do débito apurado. Entretanto a soma da parcela devida com os alimentos vincendos não pode ultrapassar cinquenta por cento dos ganhos líquidos do executado. Note-se a preocupação do legislador não só em levar a efetiva execução dos alimentos, mas também com a própria subsistência do executado quando impõe limite dos descontos, respeitando assim o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana.
Caso não seja cumprida a obrigação com a decretação da prisão civil ou com o protesto, a execução segue o rito do art. 831 e seguintes que regulam o instituto da penhora.
O art. 531 deixa claro que tal procedimento aplica-se aos alimentos definitivos ou provisórios, sendo que este último deverá ser processado em autos apartados, da mesma forma que os alimentos definitivos ainda não transitado em julgado.
Outra inovação salutar foi a possibilidade de o magistrado dar ciência ao Ministério Público de indícios de prática de crime de abandono material, caso seja constatada conduta procrastinatória do executado. Tal medida também poderá ser pleiteada pelo exequente ou qualquer outra pessoa interessada em defender os interesses do credor. Essa possibilidade não era prevista pelo CPC/73, havendo previsão apenas no Código de Processo Penal em seu artigo 5º, parágrafo 3º. A inovação é que o NCPC impôs tal providência como um “dever” ao magistrado, não sendo mera “faculdade”.
A previsão de procedimento distinto para o cumprimento de sentença que fixe alimentos é justificável pelo fato de que a cobrança de alimentos não deve se sujeitar a um processo moroso, tendo em vista a natureza alimentar, cujos valores são necessários para a subsistência do credor.
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